Relação entre repolarização precoce (ERP) e doença coronariana (DAC)

Sabe-se que em pacientes com doença arterial coronária (DAC), uma proporção considerável de eventos cardiovasculares ocorre em coronariopatas classificados como de baixo ou risco intermediário.

A partir desta premissa, pesquisadores chineses do Departamento de Cardiologia do Hospital Oriental da Sun Yat-sen University começaram a investigar o valor adicional do padrão de alteração precoce da repolarização (ERP-Early Repolarizatio Pattern, sigla em inglês) na previsão de doença arterial coronariana obstrutiva (DAC), avaliada por angiografia coronária. Eles publicaram suas conclusões no International Heart Journal em 22 de fevereiro *.

Os autores logo no prefácio definiram o padrão de alteração precoce da repolarização (ERP) como uma elevação do ponto J a partir da linha de base em valor ≥0,1 mV e entalhe ou “notch” (ranhura) no final do QRS em pelo menos 2 derivações contíguas no eletrocardiograma (ECG). padrão de 12 derivações.

A ERP tem sido comumente considerada como um achado benigno, pois é observado principalmente em indivíduos jovens e saudáveis ou em atletas sem cardiopatia estrutural.

No entanto, grandes estudos recentes de coorte e metanálise demonstraram uma associação entre ERP e arritmias fatais ou morte súbita cardíaca (MSC) em pacientes sem evidência de doença cardíaca estrutural. Além disso outros estudos observacionais relataram que a ERP estava associada a fibrilação ventricular e MSC em pacientes com doença coronariana obstrutiva (DAC).

Por ser a doença cardíovascular a principal causa de mortalidade e morbidade em todo o mundo, vários métodos de predição têm sido desenvolvidos para estimar a probabilidade de risco de eventos em um período de tempo baseados em fatores de risco tradicionais, entre estes  os importantes: Escore de risco de Framingham e QRISK.SCORE.

Apesar disso, ainda há pacientes nos quais o cálculo do risco se torna mais difícil, porque os eventos podem ocorrer mesmo naqueles com escores de baixo risco, o que requer a necessidade de melhorar a acurácia dos mesmos.

Recentemente, vários relatos de casos descreveram uma elevação do ponto J por isquemia do miocárdio e o próprio estudo prospectivo de coorte relatado anteriormente pelos autores demonstrou uma associação positiva de risco da ERP associado com a mortalidade por DAC.

Isso levanta a possibilidade de que a ERP possa estar associada à DAC obstrutiva. Neste estudo, os autores chineses se propuseram a avaliar a associação da ERP com a DAC detectada pela angiografia e se a inclusão da ERP poderia melhorar a acurácia da sua predição.

Com esse objetivo, em pacientes consecutivos submetidos à angiografia coronária, investigaram a relação entre o ERP e a DAC, avaliando sua associação.

A população do estudo consistiu de 3785 pacientes (59,9% homens, idade média de 63,1 anos) com ou sem DAC.

Ao ajustar os principais fatores de risco cardiovasculares, os autores observaram que a ERP foi significativamente associada com DAC obstrutiva (odds ratio (OR) ajustado: 2,24 [IC 95%: 1,70-2,95] ) com valor preditivo incremental (ROC AUC 0,76 contra 0,71, P = 0,02; NRI 55,3%, P <0,001; IDI = 0,05, P = 0,008), especificamente em indivíduos com baixo risco e de risco intermediário.

A presença de ERP também melhorou significativamente o valor preditivo da doença multi-vaso (AUC: 0,77 contra 0,72, P = 0,02 para a doença de dois vasos; 0,79 contra 0,73, P = 0,04 para a doença em três vasos).

Portanto, os autores chegaram a seguinte conclusão: a presença de ERP foi sistematicamente associada à estenose de três vasos e com um aumento significativo no risco de DAC obstrutiva. Estudos adicionais são necessários para confirmar esses resultados e elucidar os mecanismos patogênicos específicos.

* Mei WY, Liu LJ, Xu Q, Zheng DD, Cheng YJ. Additional Value of Early Repolarization Pattern in Prediction of Obstructive Coronary Artery Disease as Assessed by Coronary Angiography. Int Heart J. 2019 Feb 22. doi: 10.1536/ihj.18-416. [Epub ahead of print]